Resistência democrática contra o caos 

Toninho

Ânsia golpista e fragmentação nacional

Os reiterados sinais antidemocráticos emitidos pelo presidente Jair Bolsonaro e o perfil ultraconservador, religioso fundamentalista e extremado de sua base política e popular tem causado temores quanto ao nosso futuro político como nação. Alimentados por milícias digitais que infestam as redes sociais com palavras de ordem, fake news, mensagens negacionistas e pregações de confrontos e ódio, os bolsonaristas pedem ‘intervenção militar já’ como solução imediata aos males do país.

Há uma clara estratégia de tencionar o ambiente institucional com ameaças de ruptura para camuflar o agravamento da crise econômica e social, com a crescente desvalorização da moeda, perda de poder de compra, inflação, desemprego e completa inação estatal nas áreas da educação, assistência social, meio ambiente, segurança, cultura, infraestrutura etc. Sem falar na crise sanitária causada pela pandemia e o descaso governamental no seu enfrentamento.

Com a crise política ‘artificial’ criada pelo presidente da República, busca-se afastar dos noticiários o Brasil da realidade de mais de 100 milhões de brasileiros que vivem com apenas 15 reais/dia para dar lugar aos atritos de cúpula que pouco ou nada interessam à população.

Impregnados por ideologia radical, os bolsonaristas têm enormes dificuldades de diálogo. Como a extrema esquerda que prega a revolução proletária para impor sua visão de mundo, a extrema direita quer a militarização do poder político para impor à força seu modo de ver as coisas.

Os extremos se tocam, diz um velho adágio popular. Nada mais igual do que as versões radicais da esquerda e da direita no poder: ambas privam as liberdades das pessoas.

Imaginam os seguidores do presidente que para garantir a aplicabilidade de suas plataformas bastaria fechar o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, num simplismo ingênuo. A ânsia golpista desconsidera que as nossas Forças Armadas não têm lideranças que empolguem as tropas e o oficialato nesta direção, não têm unidade para aventuras antidemocráticas nem estrutura, contingente e logística para tanto.
Seria, no máximo, um ato de força palaciano que dominaria a praça dos Três Poderes em Brasília. Nos estados, setores da polícia militar, civil e guardas municipais poderiam aderir, gerando insubordinações e descontrole dessas corporações.

Um gesto arbitrário do presidente e de setores militares desencadearia um tsunami de reações no país e no exterior.
A esmagadora maioria dos governos e assembleias estaduais, prefeituras, câmaras municipais, tribunais de justiça e juízes, ministério público, funcionários públicos federais, estaduais e municipais, empresas públicas e autarquias, movimentos sociais, sindicatos, associações, universidades, instituições privadas, mídia, jornais e Tvs, populares e incontáveis grupos sociais iriam se opor e praticar a desobediência civil. Sem este ‘mar de gentes’não há quem governe este país…

Praticado o golpe, todo o esforço presidencial estaria voltado para a manutenção do poder a força, buscando assegurar um mínimo de controle. Divididas, as Forças Armadas e de segurança cairiam num perigoso vácuo hierárquico, podendo ser pulverizadas em mini-comandos autônomos, regionais e locais, numa anarquia sem precedentes. Enquanto isso, pela incapacidade prática de gestão nacional frente a tantas turbulências, a administração pública ficaria paralisada, a justiça interrompida nas instâncias inferiores e o ministério público suspenso. As políticas públicas, serviços sociais, saúde, educação, receita, infraestrutura, aeroportos, transportes rodoviários de cargas e pessoas e os transportes públicos ficariam desarticulados. O mesmo aconteceria nos estados e municípios. O desabastecimento seria o passo seguinte.

País afora a população tomaria as ruas com manifestações pró e contra o golpe e em muitas cidades fatalmente ocorreriam confrontos e violência. Fracionadas, com as linhas de comando desordenadas, as forças de segurança teriam atuação prejudicada, insuficiente e incerta. Enquanto os esforços policiais, militares, políticos e populares se dispersariam nas pautas política, as milícias, traficantes, crime organizado, bandidos e ladrões se sentiriam no paraíso.

A economia já cambaleante entraria em colapso. A desordem nas ruas afugentaria o consumidor e amedrontaria o comércio, com o aumento dos riscos de assaltos e saques. O mercado financeiro, a produção nas indústrias, as importações e exportações e os investidores internacionais suspenderiam suas atividades temendo perdas incalculáveis pela insegurança do cenário. Com a economia descontrolada, a inflação dispararia, os preços e o desemprego também. O ingrediente faltante para a explosão social final.

Internacionalmente, os países da União Europa e os Estados Unidos, seguidos de outros, condenariam o ato de força, envolveriam a ONU, aplicariam sanções políticas e econômicas e suspenderiam fluxos financeiros. Os golpistas poderiam ser alvo de processos penais internacionais, com ordens de prisão, bloqueio de contas e outras punições. Um triste espetáculo que colocaria o Brasil no rol das nações temerosas do planeta.

A única certeza do ‘golpe bolsonarista’ seria a fragmentação do país. Num quadro desolador, complexo e dominado pelos excessos e desarranjo geral, não seria de se subestimar o surgimento de movimentos separatistas. E tais movimentos atrairiam setores internacionais interessados no fracionamento territorial do país e passariam a apoiar, financiar e sustentar estas iniciativas de forma aberta ou velada. A Amazônia seria o principal alvo e não faltariam propostas para a sua internacionalização.

O ato de força presidencial transformaria o Brasil na Venezuela da direita! Aqui, como ocorre hoje lá, os golpistas teriam o controle do poder central e não da nação. Em pleno século XXI o Brasil – o outrora ‘país do futuro’, daria uma guinada para o passado.

Incompreensível assistir o país quase refém do obscurantismo político e sócio-moral-religioso depois de uma longa história marcada por lutas para uma sociedade democrática, livre e aberta. O Congresso Nacional como guardião da vontade popular tem instrumentos e prerrogativas para interromper mandatos presidenciais abusivos ou inconsequentes. Entretanto, é um poder desarmado. Se não agir na hora certa poderá perder a condição de fazê-lo mais adiante e tornar-se insignificante e obsoleto no processo. E desaparecer…

As nossas Forças Armadas e de segurança têm a obrigação de resistir aos caprichos de lideranças que almejam submeter o Estado-Nação a uma aventura personalista, vazia de significados e sem identidade com a nacionalidade. São Forças da ordem constitucional e não milícias partidárias ou de governantes passageiros.
E aos que começam a temer pelo futuro lembramos que ele é o que plantamos hoje. E um futuro promissor não tem espaço para a covardia e a omissão.

Resistência democrática é a nova palavra de ordem!